Conivência da secretária de Administração Penitenciária com projeto milionário colocará em risco policiais penais

Apesar das graves deficiências nas condições de trabalho e déficit de policiais penais Secretária autoriza projeto que ameaça a segurança penitenciária fluminense.

Apesar da ponderação responsável do subsecretário de Gestão Operacional, sobre o grave déficit de policiais penais para atenderem todas as demandas da atual rotina das Unidades Prisionais, ainda assim, e a despeito de enormes deficiências e supressão de direitos da categoria, que orbitam sob alegada justificativa de falta de recursos, a secretária de Administração Penitenciária do Estado do Rio de Janeiro, Maria Rosa Lo Duca Nebel, autorizou a contratação e execução do projeto ao custo de R$ 78.885.401,10 (setenta e oito milhões, oitocentos e oitenta e cinco mil, quatrocentos e um reais e dez centavos), sob a falsa afirmação do projeto de que “os presos do Rio produzirão suas próprias refeições”.

 

Em alerta ao subsecretário de Administração Alexander Maia, o subsecretário de Gestão Operacional Rogério Ferreira da Rocha, enfatizou que para haver viabilidade operacional do Projeto COZINHAS HUMANIZADAS – COOK AND CHILLserá imprescindível o aumento significativo no quantitativo de inspetores de polícia penal nas unidades eleitas, para que seja possível organizar o fluxo dos privados de liberdade sem que ocorra o comprometimento da segurança das referidas Unidades Prisionais. Ressalte-se que o deslocamento dos internos para os refeitórios demandará um tempo considerável, sobretudo, nas unidades com um maior efetivo carcerário.

 

Entre as 10 unidades prisionais selecionadas pelo subsecretário de Administração Alexander Maia para receberem o projeto de construção dos 20 (vinte) prédios (cozinhas e refeitórios), duas unidades prisionais chamam a atenção: as Penitenciárias Dr. Serrano Neves (Bangu 3A) e Gabriel Ferreira Castilho (Bangu 3B). Estabelecimentos prisionais de extrema periculosidade dado o poder financeiro e coercitivo dos presos ali custodiados.

 

Não bastasse o trágico histórico de rebeliões, motins e apreensão de grande volume de produtos ilícitos que, inclusive, levaram o juiz da Vara de Execuções Penais Eduardo Oberg a proibir a instalação de qualquer cantina em Bangu 3, sem a autorização da Justiça, além de vetar a abertura de licitação nesse sentido, com multa diária, à época, de R$ 10 mil em caso de desobediência, policiais penais foram assassinados por estarem lotados ali.

 

A cantina está fechada em Bangu 3 desde a grande rebelião de 2003, quando foram encontradas armas e drogas, que entravam no presídio pela cantina. O agente penitenciário do Serviço de Operações Especiais (SOE) LUIZ CLÁUDIO LIMA BONFIM, morreu nessa rebelião.

 

Diferentemente de uma cozinha tradicional, a técnica Cook and Chill se baseia no processo de cozinhar os alimentos com antecedência do serviço, e resfriá-los rapidamente para o consumo, mantendo a sensação de que o alimento foi preparado na hora. O preparo das refeições, no entanto, foi suprimido das dependências das cozinhas montadas nas unidades prisionais, ou seja, as refeições não serão produzidas na dezena de cozinhas a serem construídas. Ao contrário, continuarão sendo fornecidas por empresas contratadas e chegarão congeladas às Unidades Prisionais, onde passarão por processo de “regeneração” para “parecer fresca”.

 

O subsecretário de Gestão Operacional alertou que as novas cozinhas e refeitórios irão demandar o ingresso de uma grande quantidade de insumos e, consequentemente, maior efetivo de policiais penais para realizarem a vistoria dos alimentos nas portarias das Unidades Prisionais. Sem contar que novos postos de vigilância obrigatoriamente surgirão, atualmente todas as inspeções são feitas por amostragem porque não há equipamentos suficientes, nem disponibilização de policiais penais para atuarem nas atividades demandadas. Essa mudança de rotina no fluxo de refeições e deslocamento diário, de segunda à segunda-feira, de um efetivo carcerário de cerca de 20 mil presos, com saída das celas para um refeitório anexo, pode ocasionar sérios riscos à Segurança de todo o Complexo Penitenciário de Gericinó.

 

Há que se fazer um estudo pormenorizado quanto à operacionalidade desse projeto, anterior à sua implementação. Considerando a especificidade, complexidade e grau de periculosidade de cada efetivo carcerário. Nesse projeto “dos sonhos”, as obras exigem muito mais que mera padronização arquitetônica. Na atividade policial penal de segurança e custódia não cabe teste de operacionalidade, retórica de mudança de NGA, muito menos a ingerência de quem desconhece por completo a realidade do universo prisional. Cumpre ressaltar que a Seap não possui efetivo para absorver esse aumento de demanda na rotina diária da atividade policial penal. O último concurso público para a categoria aconteceu em 2012.

 

 

HISTÓRICO DE TRAGÉDIAS

Em 2005, o chefe da segurança do Presídio Serrano Neves (Bangu 3), HENRIQUE FERNANDES DA SILVA, de 36 anos, foi executado diante do filho, de 11 anos, no quintal da casa onde morava, em Bangu, na Zona Oeste do Rio. Os assassinos, que chegaram em dois carros, dispararam nove tiros de fuzil AR-15 e pistola calibre 45. Após apreensão de grande quantidade de maconha, quatro radiotransmissores e celulares, no presídio de segurança máxima.

 

Na noite de 5 de agosto de 2003, ABEL SILVÉRIO DE AGUIAR, diretor do Presídio Serrano Neves, o Bangu III, foi executado com mais de dez tiros, por quatro homens encapuzados, na Avenida Brasil, perto da passarela da Vila Kennedy. Segundo o então secretário de Segurança Pública, Anthony Garotinho, o caso foi esclarecido pela polícia. Segundo ele, a ordem para a execução teria partido de dentro de Bangu III, após autorização dada por detentos de Bangu I, que são da mesma facção criminosa.        



O Diretor do Presídio Serrano Neves, o tenente-coronel da PM JOSÉ ROBERTO DO AMARAL LOURENÇO, de 41 anos, foi executado na Avenida Brasil, em Deodoro, metralhado com 60 tiros.

 

O Chefe de segurança do Presídio Serrano Neves, o agente penitenciário HENRIQUE FERNANDES DA SILVA foi assassinado no quintal de sua casa, em Bangu, atingido por nove tiros de pistola calibre 45 e fuzil. As ameaças teriam partido de detentos colocados no isolamento pelo diretor da Unidade Prisional, após apreensão de maconha durante revista.                  

 

2018 – Matéria publicada no Jornal O Globo registrou que na geografia dos presídios fluminenses, o “estado maior” da criminalidade se instala na Penitenciária Gabriel Ferreira Castilho, conhecida como Bangu 3. “É lá que estão os chefes da maior facção criminosa do Rio que não foram transferidos para presídios federais”. Fragilidades como acesso a celulares, radiotransmissores, antenas e até roteadores de sinal de internet permitem que a “comissão” de Bangu 3 decida questões como invasões de morros, transferências de armamentos e sentenças de morte. “Nada acontece no Estado do Rio de Janeiro sem que antes haja uma autorização desses integrantes”, relata um ex-agente em depoimento ao Ministério Público estadual. Bangu 3 é considerado inexpugnável no sistema prisional. “Ali ninguém entra”, afirmou um inspetor.

Os depoimentos dão a dimensão de como as ordens são dadas de dentro para fora do presídio. “Eles mandam na pista”, diz um detento. Mesmo quando algum integrante de facção criminosa leva um desafeto ao alto de um morro para ser executado, não pode matá-lo sem obter autorização dos integrantes do chamado Conselho de Lideranças do CV, que fica em Bangu 3. “As ordens de execução são dadas muitas vezes pelo aplicativo WhatsApp”, informa um outro depoente.

 

O agente penitenciário PAULO SÉRGIO ARAÚJO, de 56 anos, foi assassinado na manhã do domingo (18/06/2017), quando saía de casa, no conjunto Ipase, em Vila Kosmos, na Zona Norte do Rio. Conhecido como Araújo, ele era inspetor carcerário e trabalhava como chefe de turma na Penitenciária Gabriel Ferreira Castilho, mais conhecida como Bangu 3, no Complexo de Gericinó.

 

2016 – O roteador wi-fi apreendido no dia 3 de junho na galeria da penitenciária Bangu 3, que seria utilizado por presos para se comunicar fora da unidade pesava 656 gramas, segundo laudo de exame de informática feito pelo Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE). A apreensão do aparelho chegou a ser um dos assuntos abordados num dos dez procedimentos investigatórios que foram abertos por ordem do titular da Vara de Execuções Penais (Vep), Eduardo Oberg, a fim de apurar as denúncias de irregularidades no sistema penitenciário. 

 

Polícia Penal retira 104 celulares e 3 roteadores Wifi de Bangu 3

Por Elza Gimenez, TV Globo

25/08/2022 

 

A Polícia Penal do RJ encontrou nesta quarta-feira (24) 104 celulares em celas da Penitenciária Gabriel Ferreira Castilho (Bangu 3), no Complexo de Gericinó, na Zona Oeste do Rio. A maior parte dos aparelhos estava escondida atrás das chapas de aço que revestem as celas. Ainda havia três roteadores de sinal de wi-fi. Também foram apreendidos 530 gramas de erva seca picada, distribuídos em 61 invólucros. Todas as galerias da unidade prisional, destinada aos presos que se declaram pertencer ao Comando Vermelho, foram fiscalizadas.

 

 

 

O texto do projeto é claro ao destacar a decisão de “suprimir o preparo das refeições nas dependências da cozinha, reduzindo a demanda de construções complexas e equipagem de cozinhas industriais e reduzindo o dispêndio de tempo para conclusão do processo”. Conforme recorte do documento, abaixo:

“Cumpre ressaltar que a instalação do projeto de Cozinhas Humanizadas – Cook and Chill – aumentaria substancialmente a demanda de atividades a que são submetidos os policiais penais, além do confere diurno, café da manhã, acompanhamento para assistência educacional, assistência religiosa, atendimento para Defensoria Pública, Assistência Social, Advogado, enfermaria, movimentação para apresentações externas, banho de sol, visitação dos familiares, visita íntima, almoço, jantar e confere noturno, de forma individualizada e de acordo com as suas peculiaridades”, alerta o subsecretário de Gestão Operacional.

DESVINCULAÇÃO, UMA REIVINDICAÇÃO ANTIGA

A reivindicação de desvinculação da alimentação do policial penal do processo de alimentação dos presos é demanda antiga na pauta de lutas do Sindicato dos Policiais Penais – SindSistema Penal RJ. Inclusive, a solicitação de atualização do valor do auxílio-alimentação também, considerando que a alimentação servida aos policiais penais e à área técnica da SEAP não atende aos padrões. Há muito tempo os servidores sofrem com o descaso das mazelas oriundas da má qualidade da alimentação, que não é consumida, sendo jogada no lixo, causando grande prejuízo aos servidores e ao erário público. Desse modo, muitos servidores são obrigados a retirar parte de seus salários para se alimentar, seja levando sua própria alimentação, seja comprando refeição. 

Considerando que há servidores de setores específicos que já recebem auxílio-alimentação, destaque-se que foi inaugurado o Processo SEI  210001/001694/2021, em 20 de maio de 2021, através do OF. SSSP-RJ/N°. 023/2021, com solicitação do Sindicato para extensão do auxílio-alimentação a todos os servidores da Seap, nos mesmos moldes aplicados ao DEGASE, e assim conceder ao servidor a possibilidade de alimentar-se de acordo com sua conveniência.

Após dois anos de tramitação, a reivindicação ficou na Superintendência de Recurso Humanos da Seap, encaminhada pelo Diretor Geral de Administração e Finanças da Seap, do dia 25/01/2023 até 18/05/2023, quando voltou a tramitar com o detalhamento de informações referentes aos servidores que passarão a receber auxílio-alimentação. No entanto, o processo que trata da implantação das “COZINHAS HUMANIZADAS – COOK AND CHILL”, diz que o projeto se destina também aos servidores daquelas unidades prisionais eleitas. Tal projeto, além de vincular o horário das refeições dos policiais penais ao fluxo de turno de alimentação dos presos, sobrecarrega uma rotina já à beira do colapso.

 

É duro, e nenhum motivo de regozijo. Mas, quais outros adjetivos para o subsecretário de Administração da SEAP, Alexander Maia? Longa manus, malfazejo e pusilânime são as qualidades que tem demonstrado. E claro, com a conivência de uma policial penal que autoriza um tipo de projeto dessa natureza com todos os entraves operacionais e estruturais para executá-lo. Ambos têm se mostrado imbatíveis na subserviência aos interesses que saqueiam o orçamento da Seap e deixam para o Sistema Penitenciário um legado de atraso e malfeitorias sob o argumento de modernização.

 

MATÉRIAS RELACIONADAS

Picture of Sindsistema

Sindsistema

Comentários

Av. Treze de Maio, n°. 13 – sala 709  Cinelândia, Rio de Janeiro

Newsletter

Fique por dentro das novidades e notícias

Todos os direitos reservados © 2020  |   Sindsistemas por